sexta-feira, 28 de agosto de 2020

...para o bem de São Paulo - F. da Tarde - 1955

 
Em 1955 o conhecido desenhista, professor e estudioso dos quadrinhos Álvaro de Moya, com textos de Correia da Silva, publicou na Folha da Tarde a série ...para o bem de São Paulo.

As tiras, duplas ou simples, eram basicamente uma prestação de serviços, com incentivo à doação de sangue e alguma crítica ao sistema de ensino vigente..

A Folha de São Paulo era publicada diariamente da seguinte maneira: Folha da Manhã, Folha da Tarde e Folha da Noite, com os subtítulos 1ª, 2ª e 3ª edição da Folha de S. Paulo, respectivamente, mas na prática eram jornais diferentes.

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O texto das tiras é do jornalista português Fernando Correia da Silva (1931-2014). Nascido em Lisboa em 28 de julho de 1931, exilou-se no Brasil em 1954 devido a perseguições políticas. Aqui trabalhou na Folha de S. Paulo e fundou a editora de livros infantis Giroflé e o jornal Portugal Democrático. Regressa à sua pátria natal em 25 de abril de 1974 onde vem a falecer em 18 de julho de 2014.


 Abaixo, Mauricio de Sousa homenageia Álvaro de Moya em 1970 no jornal Última Hora.


Álvaro é bastante conhecido e a Wikipedia traz a seguinte biografia:

Álvaro de Moya (São Paulo, 1930 — São Paulo, 14 de agosto de 2017) foi um jornalista, escritor, produtor, ilustrador e diretor de cinema e televisão. É considerado por alguns como o maior especialista em histórias em quadrinhos do Brasil.

Professor aposentado da Universidade de São Paulo, foi um dos organizadores da Primeira Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos (junto com Jayme Cortez, entre outros), em 1951, na cidade de São Paulo. Além de ser a primeira exposição de quadrinhos da história do Brasil, foi de ineditismo também para o mundo.

Ilustração de Moya para uma matéria sobre quadrinhos na revista realidade, 1967.

Atuou por muitos anos na televisão, onde desenhou os letreiros de inauguração da TV Tupi. Moya esteve na equipe de inauguração da TV Bandeirantes. Ele foi diretor da TV Excelsior onde criou conceitos e estruturas que revolucionaram a maneira de se fazer TV na época e que de certa forma persistem até hoje. Representou o Brasil em vários congressos sobre quadrinhos no mundo, como em Roma, Buenos Aires, Nova York e em Lucca, um dos principais do mundo. Correspondente da revista Wittyworld, dos Estados Unidos, foi colaborador de enciclopédias editadas na França, Espanha, Itália e Estados Unidos. Escolhido pela Universidade La Sapienza, de Roma, foi o único representante da América Latina em evento realizado na Itália, visando discutir o centenário dos comics.

Fez também charges e ilustrações com temáticas nacionalistas. Na Editora Abril, fez capas para as revistas em quadrinhos Disney: O Pato Donald e Mickey. Produziu quadrinizações de A Marcha, de Afonso Schmidt, para a Editora Brasil América; Macbeth de William Shakespeare para a Editora Outubro e a biografia de Zumbi dos Palmares para Editora La Selva.

Acima, ilustrações de Álvaro de Moya para o livro O Pastorinho de Aroer, de Luís Gonzaga Fleury, Editora do Brasil.

Em 1970, lançou o livro Shazam!, o livro não se resume apenas a fazer um pesquisa sobre a história dos HQs, mas conta com a colaboração de especialistas que debatem acerca da influência pedagógica e psicológica dos quadrinhos e a sua influência na cultura, tratando as HQs não somente como puro entretenimento, mas sim como um meio de comunicação que merece atenção por parte dos acadêmicos. Em 1976, traduziu e fez o prefácio para a edição brasileira de Para ler o Pato Donald de Ariel Dorfman e Armand Mattelart, publicada pela editora Paz e Terra.

Agradecimentos ao amigo Francisco Ucha.

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Livro Tiras Paulistas - 1963-1968 - Luigi Rocco

Mauricio de Sousa prestigiando o livro Tiras Paulistas - 1963-1968

Entre 1963 e 1968, três jornais paulistanos de grande circulação publicaram tiras em quadrinhos de vários autores que, nos anos seguintes, se tornariam expoentes importantíssimos dos quadrinhos brasileiros, definindo os rumos das HQs em nosso país, a partir desse período.

A Nação, Diário Popular e Diário de S. Paulo estampariam em suas páginas nomes como Minami Keizi, Mauricio de Sousa, Gedeone Malagola, Carlos Cunha e muitos outros.

Conheça neste livro um pouco dessa história fascinante que permaneceu esquecida durante vários anos, simplesmente porque os jornais, por sua fragilidade física e descartabilidade, desaparecem de nossas vistas quase que imediatamente após serem lidos, indo parar nos aterros sanitários, usinas de reciclagem ou forrando gaiolas de passarinho.


"Pesquisar e disponibilizar fatos históricos é um trabalho de preservação da memória dos mais importantes. Parabéns ao cartunista Rocco que buscou as tiras de artistas brasileiros publicadas na década de 60 nos jornais de São Paulo. Um trabalho bem feito e que nos traz momentos especiais que poderiam ser esquecidos. Agora não serão".
Mauricio de Sousa

terça-feira, 25 de agosto de 2020

Quadradinhos - Folha de S. Paulo - 1974

Artista ligado ao movimento Poema/processo (1967-1972), Franklin Horilka publicou entre setembro e novembro de 1974 a série Quadradinhos no caderno Folha Ilustrada da Folha de São Paulo.

Com um desenho estilizado de altíssima qualidade e um texto enxuto Franklin comentava poeticamente o cotidiano daqueles tempos sombrios.

Segundo a professora Daniela Diana no site Toda Matéria o Poema/processo "visava apresentar uma nova forma de fazer poesia a partir de uma nova linguagem. Com um espírito revolucionário, o grupo de poetas do movimento inovaram os poemas visuais, já explorados anteriormente pelo movimento concretista".

A série teve alguns poucos capítulos editados também no Suplemento Quadrinhos do mesmo jornal em julho de 1974.

Horilka faleceu em 1975.

Abaixo, Quadradinhos no Suplemento Quadrinhos.


sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Calafrio - Notícias Populares - 1983

A série Calafrio iniciou sua publicação no jornal Notícias Populares em 01/02/1983, com o objetivo de divulgar as revistas da editora D-Arte, de Rodolfo Zalla, o autor das tiras. A primeira HQ publicada chamava-se “40 Horas de Vida” com roteiros do Rubens Francisco Lucchetti, saindo posteriormente, no formato original de páginas, na revista Mestres do Terror 54, de outubro de 1990, com um quadrinho maior de apresentação. 

Em 34 capítulos, a aventura conta a visita de John Chandler a um parque de diversões. Lá John conhece a linda vidente Manolita, que assusta-se ao ver o futuro do rapaz em sua bola de cristal. O rapaz imediatamente apaixona-se pela linda jovem e a beija, mas esta nega seus avanços declarando não poder se relacionar com um homem morto revelando a Chandler a data e o horário de sua morte!

Haveria uma nova HQ, que foi anunciada no último capítulo da primeira história: “Noite Sombria”, mas que nunca foi publicada em virtude do atraso de um dia cometido por Zalla. A demora na entrega do material foi suficiente para a redação do jornal interromper a publicação, provavelmente uma desculpa para não continuar fazendo propaganda gratuita das revistas. Zalla já tinha diagramado inteiramente a nova aventura, mas esta nunca saiu no jornal.

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Para saber mais sobre Rodolfo Zalla clique aqui.

Sobre Rubens Francisco Lucchetti encontramos na Wikipedia: 

Rubens Francisco Lucchetti (29 de janeiro de 1930, Santa Rita do Passa Quatro, São Paulo), mais conhecido como R. F. Lucchetti, é um ficcionista, desenhista, articulista e roteirista de filmes, histórias em quadrinhos e fotonovelas.

É considerado o "Papa da pulp fiction" no Brasil.

Seu pai, Américo Lucchetti, era fotógrafo profissional e calígrafo. Fã de literatura policial, o escritor afirma ter tido contato aos 11 ou 12 anos com duas edições da revista Mistérios da Editorial Lu que trazia histórias do herói pulp O Sombra.

É pai do professor universitário e escritor Marco Aurélio Lucchetti, autor de diversos livros sobre histórias em quadrinhos (A Ficção Científica nos Quadrinhos, As Sedutoras dos Quadrinhos, Desnudando Valentina: Realidade e Fantasia no Universo de Guido Crepax) e editor de uma publicação on line, Jornal do Cinema.

Morou em São Paulo (1933-1945 e 1966-1972), Ribeirão Preto (1945-1966 e 1982-1995) e Rio de Janeiro (1972-1982). E, desde o final de 1995, reside em Jardinópolis, que fica a cerca de vinte quilômetros distante de Ribeirão Preto.

Durante 54 anos, foi casado com Tereza Pereira Lima Lucchetti, falecida em 2011.

É autodidata. Frequentou até o quarto ano Primário, estudando no Grupo Escolar "Tomas Galhardo", em Vila Romana, na capital paulista.

Além de sua intensa atividade literária e artística, exerceu as mais variadas profissões. Foi desde almoxarife até chefe de escritório.
Vida profissional

Aos treze anos de idade, começou a trabalhar como office boy numa loja de autopeças pertencente a parentes de sua mãe.

A partir de 1948, iniciou sua atividade jornalística; e, durante quinze anos (1948-1963), colaborou em todos os jornais existentes na época em Ribeirão Preto: Diário da Manhã, A Tribuna, A Cidade, O Diário, Diário de Notícias e A Palavra. Escrevia folhetins, contos, poemas e textos sobre Cinema e Literatura. Também publicou na revista pulp X-9, publicada pelo jornal O Globo e depois assumida pela Rio Gráfica Editora de Roberto Marinho.

Entre 1953 e 1962, foi proprietário de uma loja, a Monroe Auto Peças Ltda., localizada na Avenida Saudade, em Ribeirão Preto, uma cidade do interior do Estado de São Paulo.

Em 1956, atendendo a um pedido de Aloysio Silva Araújo, famoso homem da radiofonia brasileira, que, na época, era diretor de broadcasting da PRA-7 Rádio Clube de Ribeirão Preto, criou: o Grande Teatro de Aventuras, que era apresentado diariamente, de segunda a sexta-feira, nos finais de tarde; e o Grande Teatro A-7, que ia ar nas noites de domingo e que uma vez por mês era substituído pelo Grande Teatro de Mistério.

Foi um dos fundadores do Clube de Cinema de Ribeirão Preto. E, entre 1960 e 1962, realizou, em parceria com o artista plástico e cenógrafo Bassano Vaccarini, uma série de filmes de Animação (alguns desses filmes foram pintados na própria película; outros, filmados quadro a quadro), que projetaram nacional e internacionalmente o nome de Ribeirão Preto no cenário cultural.

Entre 1960 e 1965, idealizou, organizou e realizou, sob suas expensas, uma série de manifestações culturais.

A partir de 1960, começou a publicar esporadicamente na imprensa paulistana, escrevendo artigos para os jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Shopping News, entre outros.

Em 1961, foi gerente de um dos principais cinemas de Ribeirão Preto: o Cine Centenário, que ficava no centro da cidade.

Em 1964, publicou sua primeira história em quadrinhos, uma adaptação do conto "A Única Testemunha", ilustrada por Paulo Hamasaki,[3]publicada na segunda edição da revista O Corvo, da Editora Outubro. Escreveu inúmeros roteiros de histórias em quadrinhos para alguns dos maiores desenhistas do Brasil, como Nico Rosso, Eugênio Colonnese, Rodolfo Zalla, Julio Shimamoto, Sérgio Lima, José Menezes, Osvaldo Talo, Juarez Odilon, Wilson Fernandes, Sampa (Francisco Ferreira Sampaio), Flávio Colin e Edmundo Rodrigues. Começou a publicar histórias aos doze anos, na década de 1940, seu primeiro texto publicado foi "A Única Testemunha", escrito sob a influência e o impacto da leitura dos contos "O Gato Preto" e "O Coração Revelador", de Edgar Allan Poe. Na maioria das vezes, assinava com pseudônimos (sugeridos quase sempre pelos próprios editores, que não acreditavam num nome latino assinando histórias de Mistério e Horror) ou heterônimos, como Theodore Field, Terence Gray, Mary Shelby, Peter L. Brady, Christine Gray, R. Bava, Isadora Highsmith, Helen Barton, Frank Luke, Brian Stockler e Vincent Lugosi. Escreveu e publicou ao todo 1.547 livros, trezentas histórias em quadrinhos, 25 roteiros de filme e centenas de programas de rádio e televisão e inúmeros contos para revistas pulp. Para a editora carioca Cedibra (Companhia Editora Brasileira), que pertencia à espanhola Bruguera, produziu novelas de bolso de Horror e de Detetive & Mistério, além de traduzir autores estrangeiros. Criou dois reality shows (A Mansão dos 13 Condenados e Jogo das Palavras) e escreveu duas peças de teatro.

Um de seus livros, Noite Diabólica, publicado em 1963, é considerado "o primeiro livro de Terror escrito no Brasil".

Correspondeu-se, nas décadas de 1960 e 1970, com os críticos e pesquisadores Vasco Granja (de Portugal) e Luis Gasca (da Espanha).

Colaborou, durante muitos anos, no jornal A República (de Lisboa), nas revistas portuguesas Celulóide, Plateia e Tintin e na revista norte-americana CTVD: Cinema - Tv - Digest.

Em 1966, poucos meses após haver se mudado para a cidade de São Paulo, iniciou uma parceria com o cineasta José Mojica Marins, para o qual escreveu quase duas dezenas de roteiros de longas-metragens e, entre outras coisas, os scripts dos programas de tevê Além, Muito Além do Além e O Estranho Mundo de Zé do Caixão.

Com o ilustrador, desenhista e quadrinhista Nico Rosso, criou diversas revistas de histórias em quadrinhos (A Cripta, O Estranho Mundo de Zé do Caixão, Zé do Caixão no Reino Terror, A Sombra, entre outras), que renovaram os quadrinhos brasileiros de Horror.

Entre junho de 1968 e julho de 1970, foi redator-chefe da Projeção, uma revista destinada aos exibidores cinematográficos.

No final da década de 1960, criou três revistas pulp: Série Negra, Aventura e Mistério e Mistérios.

Para a Editora Prelúdio, fez roteiros de uma revista em quadrinhos de Zé Caixão ilustrada por Nico Rosso, além de roteiros para Juvêncio, o justiceiro do sertão, baseada em uma série de rádio, nordestern (um western ambientado no Nordeste brasileiro), além de criar diversas revistas masculinas em pequeno formato: Mulheres em Preto e Branco, Mulheres para Fim de Semana, Mulheres Só para Homens, Show de Mulheres e Show Girl. Logo em seguida, roteirizou a biografia em quadrinhos do apresentador e empresário Silvio Santos, ilustrada por Sérgio M. Lima.

De 1972 a 1981 foi um dos editores da Cedibra.

Por intermédio de José Mojica Marins, conheceu, em 1977, o cineasta Ivan Cardoso, para quem escreveu os roteiros dos filmes O Segredo da Múmia, As Sete Vampiras, O Escorpião Escarlate e Um Lobisomem na Amazônia.

Na década de 1980, escreveu roteiros para Calafrio e Mestres do Terror, dois gibis de Terror publicados pela Editora D-Arte, de Rodolfo Zalla.

Em 2003, com o lançamento do filme A Liga Extraordinária, publica pela Opera Graphica, o livro Os Extraordinários, onde reconta as seguintes histórias: As Minas do Rei Salomão de Henry Rider Haggard, Drácula de Bram Stoker, 20 Mil Léguas Submarinas de Júlio Verne, O Médico e o Monstro de Robert Louis Stevenson, Os Assassinatos da Rua Morgue de Edgar Allan Poe, Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle, além de um texto sobre Jack, o Estripador.

Em 2014, a Editorial Corvo, uma empresa do grupo Editorial ACP, lançou a Coleção R. F. Lucchetti, que irá publicar quinze de seus livros. O primeiro título da coleção é As Máscaras do Pavor.

Em 2015 o radialista e escritor Rafael Spaca lançou o livro "Conversações com R.F.Lucchetti" (Editora Verve).

Ainda em 2015, publicou pela Editora Laços a romantização de seu roteiro original de O Escorpião Escarlate. No ano seguinte, lança a romantização de As Sete Vampiras.

Atualmente, está escrevendo um roteiro de longa-metragem: O Lago das Mortas-Vivas, cujas protagonistas, cinco jovens zumbis, aterrorizam uma pequena cidade do interior do Brasil.

Em 2016 é lançado o curta-metragem "R.F.Lucchetti, a Multiplicidade da Linguagem", de Rafael Spaca.

Em 2018 pela Editora Sebo Clepsidra, publicou Poemas de Vampiros, ilustrado por Anasor e organizado por seu filho Marco Aurélio Lucchetti, que reúne poemas escritos em várias épocas. No mesmo ano, a editora faz um financiamento coletivo no Catarse de uma biografia em quadrinhos de Edgar Allan Poe, escrita por Lucchetti com desenhos de Eduardo Schloesser.

Agradecimentos ao amigo Worney Almeida de Souza (WAZ).

terça-feira, 18 de agosto de 2020

Chulé - revista Gol - 1980

No início da década de 1980 o cartunista Edra criou a série esportiva Chulé. Focada no mundo do futebol as tiras apresentavam além dos jogadores Chulé e Eubelo, o repórter Carrapicho e os cartolas Vivaldino e Incompetildo

Lançados em 1980 na revista Gol, em Brasília, foram publicados também nos jornais Jornal de Brasília, Correio do Brasil, Gazeta de Taguatinga (DF), A Semana e Diário de Caratinga (MG).


Carrapicho.

Sobre a série a revista destacou em reportagem: 

"O primeiro cartunista a bolar personagens esportivos em Brasília foi o
mineiro de Caratinga, Élcio Danilo Russo Amorim, que criou o repórter Carrapicho, o jogador Chulé e os cartolas: Vivaldino e Incompetildo.

Vencedor de quatro concursos nacionais de charges e cartuns, o desenhista, que assina como Edra, acha que os heróis esportivos não têm dado certo nos quadrinhos brasileiros por um motivo muito simples: o futebol é uma espécie de carteira de identidade do brasileiro, mas os quadrinhos bolados nesse campo fogem da realidade do esporte e não respeitam a linguagem popular. Inquestionavelmente, sustenta Edra, as historinhas envolvendo o futebol não foram para esse lado; para o mundo do futebol.

É plano de Edra lançar, trimestralmente, uma revistinha com seus heróis esportivos, mas seu grande problema é patrocinador, já que os custos de uma produção gráfica ficam proibitivos para ele, que vive apenas de salário de jornalismo.


Eubelo.

Os personagens de Edra têm esta alma:


Chulé - um anti-herói que pode ser ingênuo, hoje, e genial, amanhã. Na realidade, Chulê representa o sonho de criança do desenhista, que gostaria de ser um craque. Nessas tirinhas, Edra transfere para o jogador todas as glórias e frustrações que ele poderia viver.
 

Carrapicho - é o repórter que gruda, perturba, faz tudo para conseguir a informação que ele quer. Sua forma física foi inspirada em um repórter, Luisinho, que à época era colega de Edra no Correio Braziliense. O desenhista ficava imaginando aquele baixinho entrevistando um jogador de basquetebol, e aí pintou a figurinha.
 

Eubelo - um jogador que conquista popularidade, e que depois passa a preocupar-se muito mais com o seu visual e os compromissos sociais, esquecendo o lado do
atleta. Eubelo, não terá como modelo nenhum craque, especificamente, mas jogará preocupado se o cabelo não ficou desalinhado após uma cabeçada e com o melhor ângulo
para os fotógrafos lhe flagrarem no lance. Qualquer semelhança com Muller ou Renato Portaluppi será mera realidade para esta grande coincidência.
 

Os Cartolas - Mostra a incompetência dos nossos dirigentes esportivos, ironizando inteiramente suas características, sempre colocando seus interesses acima de tudo".

Os Cartolas.

A série teve ao menos um livro publicado em 1993 pela editora Art Impressa.

Sobre o autor:

  • EDRA, Élcio Danilo Russo Amorim. Natural de Caratinga, MG – Brasil. Cartunista / Produtor Cultural / Jornalista / Design Gráfico / Editor.
  • Iniciou a profissão de cartunista no Correio Braziliense (DF), passando também pelo Jornal de Brasília e Correio do Brasil. Foi editor de arte da Revista “GOL” (1980).
  • Premiado 27 vezes,  selecionado em vários salões de humor no Brasil e no exterior desde de 1981, quando foi selecionado no Salão Internacional de Humor de Piracicaba.
  • Realizador do Salão Internacional de Humor de Caratinga, que com quinze edições, é o principal de Minas Gerais e está entre os melhores do país.
  • Idealizador/ Fundador da Casa Ziraldo de Cultura e da Gibiteca Turma do Pererê.
  •  Membro da Comissão Julgadora de Premiação do Salão de Humor do Piauí (2005), Brasília (2005), Piracicaba (2018), Belém (2018) e China (2019).
  • Tem trabalhos publicados em diversos jornais e revistas brasileiros e do exterior.
  • 28 livros publicados, com destaque para o livro Ziraldo - Ao Mestre Com Carinho, (Editora Melhoramentos) premiado com o Troféu HQ MIX (2019). 
  • Editor, Membro da equipe internacional do MAC – Morocan Association of Cartoon, dentro projeto Cartoons Anthology (Romênia). 
  • Colabora para importantes editoras do país, tais como: Melhoramentos, Positivo, Moderna, FTD, Leya Edições, Pitágoras, Base Editorial(PR), Kroton, Alto Astral, FUNEC, Organização Educacional Farias Brito (CE) e para diversos autores. 
  • Presidente da Associação Estação Cultural de Caratinga.
  • Idealizador da 1ª Feira Literária de Caratinga (2018).
  • Chargista do Diário de Caratinga, durante 13 anos e do Diário de Manhuaçu e Diário de Teófilo Otoni em 2015 e 2016. 
  • Colabora com diversos sites de humor, com destaque para o Chargeonline e Brazilcartoon.

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Plóium - O Diário de Ribeirão Preto - 1975


Uma cabeça com pernas, essa é basicamente a definição do personagem Plóium, criado pelo cartunista Washington para os jornais de Ribeirão Preto - SP, durante a década de 1970.

Junto com seus amigos Jubinha, Carpinha e Tip, Plóium fazia críticas sociais e políticas com os assuntos do momento.

Em 1979, Washington reuniu as tiras de Plóium em uma edição independente, da qual retiramos a seguinte explicação:

"PEQUENA HISTÓRIA DE UM AUTOR E SEU PERSONAGEM.

Plóium nasceu no ano de 1970, parto normal, presentes estavam: um pedaço de papel, um lápis e eu. Bem no meio daqueles números de matemática, para os exames de fim de ano, é que brotava, no meio dos rabiscos, aquela forma: sem barriga, (com as pernas saindo da cabeça, estatura baixa, com cabelo em forma de espanador meio usado, olhar matreiro, riso irônico, (característica do brasileiro) e uma cabeça cheia de... (que também é característica do brasileiro). Outro detalhe é o seu nome, que quase ninguém consegue pronunciar direito, e o autor morre de rir.

A BATALHA POR UM ESPAÇO.

Há uns cinco anos, procurei a redação dos jornais para mostrar os trabalhos. Achei que estava na hora de tirá-lo da gaveta. A primeira coisa que um desenhista faz quando cria alguma coisa é engavetar o trabalho até a ideia amadurecer, ou talvez por vergonha.

Não puderam atender-me por vários motivos: falta de espaço, clichês caros, contenção de despesas. E importar historinhas era mais barato, e era o que importava, (hoje também). E eis que neste marasmo todo, surge o Sérgio de Souza. Colocou anúncio no jornal pedindo colaboradores, escritores, poetas, desenhistas de HQ, (abreviatura de histórias em quadrinhos) e outros. Fui nessa, e no dia 1 de novembro de 74 e 17 de novembro do mesmo ano, saía a primeira página do HQ Ribeirão Pretana.
Os desenhistas eram: O Cássio (garoto de 7 anos), Carmo (estudante de odontologia) e eu. E como tudo que é bom, às vezes dura pouco, devido à contenção de despesas, a página de quadrinhos acabava, e o Plóium voltava pra gaveta. 

No dia 17 de agosto de 75 comecei a publicá-lo no DN, ficando até 29 de agosto de 76. Foi um tempo bom, embora o Plóium de personagem infantil que era, passou para contestador social, político e religioso de linha (e ainda por cima em um jornal de arquidiocese). No dia 18 de novembro de 75 o Plóium muda de jornal, e cai no O DIÁRIO, (agora com off-set) e censura, ficando até 12 de fevereiro de 77, (sem cachê). Nesta época apareceram ótimos artistas, principalmente na área de cartum, vale aqui citar alguns nomes: Glauco, Pelicano, Cleido, Zé Luís, Arnaldo, Guilherme e outros, como o Zé Antonio que ainda estão escondidos por aí à espera de uma oportunidade.

Hoje os tempos são outros. Houve uma evolução, mas ainda falta a conscientização do empresário em acreditar em uma HQ Nacional e local. A finalidade principal desta revista, (além de divulgar o meu personagem), é apresentar uma seleção das melhores tiras publicadas nesses dois anos de imprensa, e ao mesmo tempo abrir campo para que outros desenhistas façam o mesmo, e que mostrem seu valor. Valor este que é um benefício para a própria coletividade. E tenho dito".

Agradecimentos ao amigo Floreal Andrade.

terça-feira, 11 de agosto de 2020

Rodolfo Zalla - Entrevista - 2008

Entrevista inédita com o desenhista argentino radicado no Brasil, Rodolfo Zalla, falando sobre as tiras de jornal que produziu. Realizada em 05 de novembro de 2008 pelo jornalista Worney Almeida de Souza, o WAZ.

A entrevista começa falando sobre a série Amores Históricos, publicada em 1964 no jornal Última Hora e distribuída pela Barbosa Lessa Produções.


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WAZ: Por que você veio para o Brasil?

Zalla: Naquela época, (início dos anos 1960) com a experiência que tive na Argentina, pensei: O que vou fazer aqui? Estão queimando os jornais!


Ficha de entrada de Zalla no Brasil. 4 de dezembro de 1963.

WAZ: Então vamos começar. Quem que era a Barbosa Lessa afinal?

Zalla: Barbosa Lessa era um agente que fazia shows, principalmente ligado ao automobilismo e todo o tipo de show. Fazia também decoração para carnaval, preparava shows para clubes.

E coordenou quando nós começamos a tentar colocar material no mercado, eu tinha chegado já praticamente em dezembro de 1963 em São Paulo, em Santos, nessa época (vindo da Argentina). E levamos material para o Luís Sanches. O Barbosa sabia que o jornal Última Hora estava preparando um segundo caderno, com Marisa Alves.

WAZ: O UH Revista?

Zalla: Exatamente. Trabalhavam Alik Kostakis, Jô Soares, Gianfrancesco Guarnieri, todo um pessoal de primeira, Álvaro Paes Leme... E nisso apresentamos essas tiras para o Sanches, Sanches passou essas tiras para o Barbosa Lessa, Barbosa Lessa foi ao jornal e conseguiu inaugurar em São Paulo essa seção de tiras.

WAZ: Até então ele nunca tinha trabalhado com quadrinhos? Com distribuição de quadrinhos?

Zalla: Não, nunca tinha trabalhado. Começou conosco. Então ele pegou o material que mandei e improvisava, e mandou para Santos, onde eu estava morando com Delbó, e se apresentou, e nós começamos a falar, então ele queria fazer, dentro da improvisação, porque era um negócio rápido inclusive, e me apresentou uma página do jornal O Globo que tinha uma seção de amores históricos e crimes históricos, que publicava O Globo nessa época, um material inclusive francês, rápido, de tiras. E ele queria uma seção de amores históricos, e eu, porque não, propus de eu fazer em tiras, e tinha também a ideia da Gatinha Paulista, inclusive foi dele, então Delbó pegou essa tira, porque Delbó estava com trabalho na editora Outubro e também estava trabalhando para a editora Yago na Argentina, mandava trabalho para a Argentina. Ele já estava com muito trabalho e eu estava até ajudando nessa época. O primeiro trabalho que fiz, que é nosso, digamos assim, foi O Vingador que ele estava fazendo para a editora Outubro e eu ajudei a acabar esse Vingador. E precisava material, ele já estava com a tira mas nós não vimos a tira sair porque nós entregávamos a tira para Luis Sanches e apareceu o Barbosa, e ele era de fato muito bacana, e ficou, e fizemos Gatinha Paulista e Amores Históricos.

Amores Históricos começamos com Chica da Silva, porque nessa época do carnaval do ano de 1964 e o personagem Chica da Silva ia ser uma passista do Rio que encarnou o personagem e ganhou um prêmio, deram um prêmio para ela, então, bateu em cima, então vamos começar com Chica da Silva. Depois ele me deu o livro do Paulo Setúbal e falou, vai lendo isso porque aí você escolhe uns trechos que a gente vai trabalhando em cima para fazer a Marquesa de Santos. E a partir daí, pra começar o roteiro, você me dá um um tempinho aí, para começar Amores Históricos.

WAZ: Chica da Silva foi um roteiro seu?

Zalla: Sim, Chica da Silva, nós falamos com ele, eu comecei a fazer o roteiro, imagina que nessa época eu não conhecia nada, nem português, inclusive. Depois comecei a tomar aulas, diretamente já com um camarada para que ele me corrigisse o português, fundamentalmente, pra matar dois coelhos com uma cajadada. Aprendia o português e fazia o trabalho. Com esse camarada praticava o inglês e praticava o português. Especialmente o português. Um cara muito acessível. Dessa maneira começamos a trabalhar por telefone e isso e aquilo, e ele me propôs apresentar o tratamento completo: Como você sabe fazer letra é o ideal! Porque ele me contou que entregou um material para o Luís e o Luís entregou para um camarada letreirar, e esse camarada era estudante, então o camarada deixou o material de lado e começou a se preparar para os estudos, para os exames, e ficou parado três meses! Depois quem letreirou fui eu, mas ia fazer o que? Então pra evitar que aconteça, se a coisa começa a ir, então seria bom entregar todo o material completo. Aí comecei a ver a oportunidade de letreirar rápido em português. Nessa altura, de fazer o roteiro, eu era um produtor praticamente. Então eu conheci, na praia de Santos, um camarada muito bacana, que era professor de inglês também e eu falei: Você vai fazer um negócio muito especial comigo.  E falei para ele o que eu queria, e ele topou, e isso, praticamente três vezes por semana, ou todas as vezes que eu precisava, quando tinha um roteiro, especialmente quando tinha um roteiro em português, ele me corrigia.

WAZ: Aquele formato de uma tira comprida na página inteira (vertical), foi ideia sua?

Zalla: Não, não! Barbosa já veio com uma página de O Globo. Isso veio na página de O Globo. Só que eu fiz no meu estilo, mais trabalhado. Nem falei para o Barbosa de fazer esse tipo francês, de estilo rápido, manchado, porque inclusive o material francês tinha retícula, aguada, o cara trocou por uma retícula, ou uma retícula aplicada mecanicamente. Então nós fazíamos em branco e preto, o máximo que poderíamos colocar nesse material era uma retícula mecânica. Essa retícula Letraset, tinha trazido da Argentina.


WAZ: Porque o cabeçalho dele era meio assim pintado, assim 'Amores Históricos'!

Zalla: Sim, mas era branco e preto, não tinha aplicação de meio tom, porque nos jornais você sabe como é o clichê, você pode marcar a retícula nas cores e o o cara te faz, mas nós trabalhamos tão em cima do prazo do jornal que nós preferimos entregar o trabalho totalmente completo. Então o que seria o meio tom a gente reticulava com uma pena, uma pena 291 ou uma pena 179. Então a gente entregava pronto, porque você não tinha o problema do gravador esquecer ou de não ter tempo muitas vezes de fazer mecanicamente a retícula. Porque em uma oportunidade, nós colocamos num jornal que estava aqui na avenida 9 de julho, e eles praticamente faziam na hora esse material. Mas, quando apertava o tempo, então às vezes, você imaginava uma retícula e de repente não aparece, então às vezes nós cobríamos...

WAZ: Então você fez Chica da Silva e Marquesa de Santos?

Zalla: Sim! Amores Históricos nós fizemos vários, inclusive, comecei com Chica da Silva, Marquesa de Santos, Garibaldi e Manoela e que eu me lembre, aquele do sul, que não me lembro agora o nome. Porque depois quando o jornal cortou a tira, só ficou com A Gatinha, que depois também cortaram, ficou somente Amores Históricos durante um tempo. Deve ser inclusive, porque o jornal praticamente estava acabando, eu trabalhei depois da revolução uns três, quatro meses fazendo só a parte de Amores Históricos, mas aí eu já estava com a editora Outubro pra começar a trabalhar, para pegar mais volume de trabalho.

WAZ: Essas histórias duraram quanto tempo mais ou menos?

Zalla: Chica da Silva não durou muito. A que durou mais foi Marquesa de Santos, deve ter durado um mês e meio. A Chica durou duas semanas.

WAZ: Eram seis tiras por semana, porque o jornal não saia aos domingos, né?

Zalla: Exatamente, seis por semana. Seis tiras em um quadro grande e dois mais pequenos, ou três mais pequenos, não me lembro bem.

WAZ: E todos você fez o roteiro? Você fez também a pesquisa?

Zalla: Não! Quando eu terminei Marquesa de Santos o Barbosa começou a me dar os roteiros. Eu comecei a trabalhar em cima dos roteiros porque eu queria adiantar o material, eu dava preferência a trabalhar em jornal, sempre gostei de trabalhar em jornal. Eu tinha feito isso na Argentina, mas tive uma experiência curta, não tinha nem democracia, aí trocaram os objetivos do jornal, uma época meio brava, época de Perón também. Não foi um material de republicação também, não era nada importante, mas os jornais estavam em franca decadência nessa época também, por causa dos dirigentes. E a experiência não foi boa mas também não foi uma experiência! Então, essa experiência que eu estava tendo agora era impressionante, porque foi uma espécie de ensino, então você adianta 4, 5 dias e pensa que está adiantado e não é nada disso! No trabalho em jornal para você se sentir à vontade, imagina, a gente tem que ter 10, 15 dias de adiantamento, era isso o que eu queria, porque a tira do Jacaré Mendonça, essa sim eu fiz adiantado.

WAZ: Mas por exemplo, a Chica da Silva você falou que fez a história completa e entregou, aí a Marquesa de Santos você foi fazendo e entregou toda completa?

Zalla: Não, não! Nós íamos entregando na medida que acabávamos o trabalho, porque nós começamos o trabalho, três dias depois o jornal começou a publicar, então praticamente esse jornal era um fantasma que caiu em cima de nós! A primeira coisa que eu tentei fazer, porque nessa época eu fazia as letras para a tira do Delbó, foi quando Delbó se transferiu de Santos para São Paulo, ele começou a letreirar por conta dele, também porque eu já não podia viajar de Santos a São Paulo, não havia forma de cumprir a data se eu teria que letreirar material para ele, então ele cumpriu muito bem isso.

WAZ: Mas quando você fazia em Santos você vinha entregar ou mandava pelo Correio?

Zalla: Eu mandava por entregador, mas teve alguns pequenos problemas também porque daí que eu queria adiantar para viajar para São Paulo, e eu entregar o material, mas às vezes, principalmente no começo, nós usamos um entregador. Eu telefonava para o Barbosa: Está saindo pelo entregador! Mas só que esse entregador fazia todo o circuito de São Paulo e deixava esse material para o final. Um entregador não tem noção do que é um jornal, como se trabalha, horário e se está em cima da data ou não está. Então às vezes tinha que sair correndo. Por sorte Barbosa estava na Praça da Bandeira, daí para o jornal era uns três, quatro quarteirões, daí saiu correndo um dia o Barbosa para entregar o material para sair no outro dia. Daí que falei para o Barbosa: Nós temos que adiantar de qualquer maneira, porque qualquer coisa que acontecer por esse trechinho, às vezes o material vai parar sabe Deus onde! Até some. Então, entregando nós! Mas sabe que não aconteceu nada disso. Foi um atraso, dois atrasos feios, que o Barbosa salvou na hora e o resto já começamos a adiantar o material. Então, eu viajava e entregava!

WAZ: Mas o Barbosa só distribuía o material pro Última Hora de São Paulo? Ou pra outros jornais?

Zalla: Bom, de início para São Paulo, porque a ideia era de crescer, mas depois dessa confusão e o que aconteceu com Barbosa, acho que ele não confiou muito no mercado de quadrinhos, porque eu poderia, inclusive nós demos a ideia, para ele editar material. Nessa época nós poderíamos oferecer um bom material para ele com a certeza de que o material saia, porque ele pagava o fotolito e o papel em 90 dias, era só fazer o boneco da revista e começar, essa teria sido uma caminhada boa e longa, tenho certeza. Ele era um camarada bacana para trabalhar, mas ele não conhecia nada de quadrinhos, além de não conhecer nada de quadrinhos também, ele tinha muita coisa para resolver, então ele queria resolver problema dessa produção, problema de som, problema de contratar artistas e o trabalho nosso era uma complementação de todo esse trabalho dele, porque uma parte era artística, parte periodistica, digamos assim, da empresa, mas o que ele conhecia mesmo era trabalhar com artistas.

WAZ: Era uma parte menor, as outras coisas davam muito mais lucro.

Zalla: Acredito que sim!  Ele não via o negócio porque não conhecia o negócio. Se tivesse entrado com um editor ele não precisava ter essa produção, que dava muito trabalho. Por exemplo, quando ele fez a decoração do Clube Vasco da Gama, em Santos, nós estávamos morando em Santos também, e fomos ver lá, fomos a pé e voltamos a pé, nós estávamos perto, estávamos no Embaré, Vasco da Gama estava mais na Ponta da Praia, e teve um camarada que ele colocou no quadrinho também, o Airton, um moreno, muito bacana, e ele era encarregado de contratar os artistas que iam fazer a decoração desse clube, além dos artistas que o clube ia contratar. E claro, devia dar dinheiro, não sei como seria essa coisa, nunca perguntamos para ele, que dá trabalho, dá muito trabalho, precisa muita gente. Aí foi quando conheci um cara gaúcho também muito bacana, Wilson Cavalieri, que depois me trouxe, inclusive, uma documentação, um trabalho que ele tinha feito em um museu em Porto Alegre sobre trajes gaúchos que saíram em revistas e gostava muito dos quadrinhos também. Mas o Airton era encarregado, então o Delbó colocou em uma história, com o Airton, com uma menina, na televisão...

WAZ: E você se lembra quanto você recebia? Você recebia pela história inteira ou era por tira?

Zalla: Recebia por tira!

WAZ: E o pagamento, para aquele período, era bom?

Zalla: Era extraordinário. Inclusive devo ter até o recibo. Queria colocar nesse livro que está com o Gonçalo (JR.), e que está demorando um pouco pra sair. Naquela época o trabalho nosso se publicava em toda a cadeia do Última Hora. Começamos a publicar também em Santos, depois cortou. E em Porto Alegre e no Rio. E nós recebíamos o mesmo dinheiro por cada republicação. Tanto em Porto Alegre como no Rio de Janeiro, recebíamos o mesmo. O que prejudicou um pouco foi Gatinha Paulista, que foi localizado, mas Amores Históricos publicava no Rio, e os Amores Históricos foram publicados também em Porto Alegre e a tira de Jacaré Mendonça que era publicada em São paulo e Porto Alegre também. Em Porto Alegre, inclusive, começou como um jornal bom, mas parece que depois cometeram um erro. Começaram com Chica da Silva e depois por um problema de racismo cortaram atira.

WAZ: E não foi até o final?

Zalla: Não, não foram. Me parece que saíram em três edições, em todos os jornais.

WAZ: E você falou em 1964. Eu pesquisei no Última Hora, para o projeto do Gianfrancesco Guarnieri (Crônicas 1964, editora Palavra Escrita, 2007), era o Jorge da Cunha Lima que editava o jornal, aí ficou oito dias sem sair o jornal.

Zalla: O editor era o Jorge da Cunha Lima?

WAZ: Sim, Jorge da Cunha Lima. Ele entrou em janeiro de 1964 e foi ele que criou esse UH Revista. Então, até 1º de abril de 1964 era ele, depois o jornal ficou oito dias sem sair, quando o jornal voltou, o Jorge da Cunha Lima foi embora, o Gianfrancesco Guarnieri também deixou de publicar e saiam outras coisas. As tiras e os Amores Históricos continuaram?

Zalla: Continuaram.

WAZ: Mas todas tiveram um final?

Zalla: Não, não tiveram um final, é o seguinte: a tira Gatinha Paulista continuou em São Paulo...

WAZ: Sim, porque ela foi indo e depois o jornal só publicava ela, um tirinha!

Zalla: A Gatinha Paulista era publicada em Porto Alegre também, no jornal Última Hora, que depois virou Zero Hora, e Barbosa me pediu, quando cortaram a tira aqui em São Paulo, Barbosa me pediu que continuasse a tira de Jacaré Mendonça e que eu desse um final mais ou menos rápido para ele ficar bem com o pessoal do sul, para acabar a história, certamente. E realmente, essa história, no sul, acabou na tira 150. Eu fiz um final rápido da história, mas aqui em São Paulo a tira foi cortada. A Gatinha continuou, tanto assim que quando Delbó voou para os Estados Unidos ele combinou que eu iria continuar a tira. E eu continuei a tira porém não foi publicada, porque eu viajei para a Argentina para visitar minha velha, meu velho, e quando eu voltei, já estava com o material pronto, entreguei o material. Nessa época o secretário de redação era o Inácio de Loyola Brandão, e ele me explicou que tinham perdido as tiras em uma gaveta, não sei o que e isto e aquilo e eles cortaram a tira!

WAZ: E ficou sem final?

Zalla: Ficou sem final! A Gatinha Paulista ficou sem final. Esse final, somente eu e Delbó conhecemos.


Gatinha Paulista por Rodolfo Zalla, mas creditada a José Delbó.

WAZ: Porque eu me lembro que eu fui acompanhando o jornal e só ficou a tirinha ali da gatinha Paulista e depois eles colocaram na seção do jornal normal mesmo. Era uma página, sei lá, economia, política, e saia a tira lá embaixo, um negócio meio torto, fora de contexto.

Zalla: Sim, e devem ter sido poucos dias que saiu assim no jornal.

WAZ: Mas era cumprida a (história da) Gatinha Paulista, né?

Zalla: Sim, inclusive a história era bem bolada, era interessante, chamava a atenção, prendia o leitor. Tinha um contrabando de cocaína dentro desse avião, e tinha um cara, um gordo, com um cachorro e esse cachorro causava problemas porque latia e prejudicava os passageiros dentro do avião e uma série de coisas, então o gordo discutia com a comissário de bordo e o cachorro é que chamava a atenção na tira. Acontece que as barras da jaula do cachorro estavam com o interior cheio de cocaína, então a história era por aí, mas ficou sem final, porque o Delbó ia me mandar o fim dos Estados Unidos, e depois eu pedi para ele e falei o que tinha acontecido e que a tira havia parado.

WAZ: O Delbó foi para os Estados Unidos quando? Em 1964 mesmo?

Zalla: Em 1965, mas ele saiu daqui em 1964 e foi para Buenos Aires de novo, e lá preparou de novo a viagem, porque ele teve um problema com a embaixada americana em Buenos Aires quando ia viajar para os Estados Unidos, então até resolver o problema com a embaixada americana ele decidiu vir ao Brasil, e nesse tempo ele trabalhou um ano mais ou menos aqui, um pouco menos de uma ano, chegou em agosto de 1963 e ficou até, me parece, julho de 1964, uma coisa assim, aí ele voltou para Buenos Aires, nos encontramos em Buenos Aires, ele me deu o roteiro lá, assinamos uma transferência de direito autoral para eu apresentar aqui no jornal, isso tudo em menos de um ano! Mas não continuou, claro, não tinha condições. Eu assumi o trabalho de Delbó, não somente com a tira mas com o Colorado também, que ele havia criado para a editora Outubro. O Colorado nós fizemos uns 5, 6, 7 números!

WAZ: O Jacaré Mendonça você que criou?

Zalla: Sim.

WAZ: E como é que era a história? Era um aventureiro, né?

Zalla: Sim, um aventureiro. A história do Jacaré Mendonça eu vou te contar desde o começo. A coisa foi tão rápida que eu tive que criar um personagem, mas o Delbó tinha mais prática no mercado e ele tinha feito uma listagem com uns seis, sete personagens diferentes. O nome, né? O nome e mais ou menos: um aviador, um piloto, uma série de coisas. E dessas descrições o Barbosa gostou mais da aventura. Então, eu tinha feito um personagem na Argentina que se chamava Rash Nelson, que era um aventureiro. E o material inclusive estava comigo, tinha trazido comigo aqui ao Brasil, então eu achei interessante começar com esse personagem, só que no lugar de começar na Inglaterra começar no período de D. Pedro II aqui no Brasil. E a história foi mudando, porque numa oportunidade quando viemos com Delbó para São Paulo, nós compramos uma revista maravilhosa dessa época que era a Life, em espanhol, que aparecia no mercado. E se completavam 50 anos da Guerra de 1914, e saiam umas reportagens fantásticas. E nesse período, quando íamos com Delbó no ônibus, eu ia folheando a revista toda, e tinha (uma reportagem sobre) um clube de pólo e que mostrava como vivia a aristocracia nessa época da Guerra de 1914, a época da Belle Époque, como chamavam. E falando com ele isso me ocorreu uma ideia: aqui tem uma ideia boa para o Jacaré Mendonça. E começamos a falar, falar e praticamente a historia toda me veio à cabeça. Acontece que, de tão entusiasmados que estávamos planejando quadrinhos, aconteceu que esqueci a revista no ônibus. E fiquei louco!  E então fomos às bancas e nessas bancas não tinha a revistas. Era importada! Não somente por esse detalhe mas por toda a documentação que publicou a Life! Que foi os 50 anos da guerra de 1914 e dos 25 anos da Guerra de 1939. Uma reportagem fantástica, com o quadro histórico da época e com os ilustradores da Life! Uma coisa que já não se faz mais e que os desenhistas de hoje praticamente não conhecem. E nós averiguamos com um jornaleiro e o jornaleiro me disse: Você pode encontrar essa revista com o distribuidor. Que era a agência Modesto, em São Paulo, na Santa Efigênia. Só que na agência Modesto nós chegamos às 4 da tarde, porque nesse ínterim nós encontramos ao meio-dia com Nico Rosso e íamos passar na Escola Panamericana de Arte, quando estava aqui na rua Augusta 49, no começo da Panamericana, depois fomos a outro lugar que não me lembro e depois fomos na agência Modesto procurar a revista e por sorte tinha. Eu comprei e já segurei com muito carinho pra não perder.



Jacaré Mendonça.

 
WAZ: E você achou aberta!

Zalla: É, mas as distribuições das revistas eram feitas até tarde! A história é essa, que eu me lembre. Então, claro, à medida que eu fui criando essa nova história eu já tinha praticamente todo o roteiro, as aventuras, já sabia que ia na Argélia, na Austrália, Isla Marguerita, os caçadores de cabeça e tudo aquilo. Mas quando o Barbosa viu ele me perguntou: Mas por que você tirou o personagem do Brasil? Falei: Barbosa, é que eu não conheço a História do Brasil pra colocar o personagem, à medida que estou fazendo agora estão surgindo ideias, mas tenho uma séries de aventuras já planejadas. Posso encurtar a parte da Malasia, Itália e voltar para o Brasil! Aí foi quando veio a Revolução e já acabou tudo!

WAZ: Na verdade só teve uma aventura dele?

Zalla: Na realidade foram três aventuras. Só que a terceira não acabou! Foi a aventura que eu acabei o final para Porto Alegre. Adiantei a tira. Adiantei os últimos acontecimentos, um resumo violento e acabou essa terceira aventura.

WAZ: E o Barbosa Lessa, quando teve a revolução, o que aconteceu com ele?

Zalla: Ele foi para Porto Alegre.

WAZ: Ele abandonou o que ele tinha aqui e foi para lá?

Zalla: Ele estava em Porto Alegre. A sede dele seria lá, digamos assim. Tinha um cunhado, parece, Carlos Lessa, que tomava conta disso aí, tinha conhecimento direto com os jornalistas, estava aqui em São Paulo, tinha aberto a agência aqui em São Paulo, não sei se ele teria interesse mais pra frente em ir para o Rio também, abrir agência no Rio, só sei que ia se expandir. A revolução mudou tudo isso, ele continuou em São Paulo, mas quando acabaram as tiras eu não tive mais contato com ele. Já comecei a trabalhar em editoras e acabou o contato com ele. Então, depois, um pouco tempo depois nos encontramos.

WAZ: Então ele agenciou até a Gatinha Paulista?

Zalla: Sim, Gatinha Paulista parou e ele continuou agenciando, no caso para mim, Delbó estava nos Estados Unidos, ele continuou agenciando Amores Históricos. Ele publicou vários, não se Jacobina, também. No Última Hora.

WAZ: Mas depois da Revolução só continuou publicando aqui em São Paulo? Ou nos outros jornais da cadeia também?

Zalla: Não, só em São Paulo e no Rio continuou Amores Históricos.

WAZ: Mas esses você conseguiu encerrar todas as histórias?

Zalla: Bom, eu não sei a publicação no Rio como era porque eu recebi só um jornal do Rio. Ele um dia me mostrou e eu até pedi o jornal, está comigo aí, e o segundo caderno no Rio era feito de uma forma bem diferente da de São Paulo. Não só pelo pessoal de lá, mas outros tópicos.

WAZ: Mas era do mesmo jeito? Aquela linguiçona assim?

Zalla: Sim, mas por exemplo, a página que eu tenho do jornal do Rio de Janeiro, estou publicado no meio da página, enquanto aqui em São Paulo era do lado direito.

WAZ: Que coisa estranha! No meio você perdia a página inteira do jornal!

Zalla: Não, mas do lado tinha as seções! A história era o chamariz.

WAZ: Quer dizer que depois de Amores Históricos ele parou de distribuir?

Zalla: Eu acho que sim, porque não tive mais contato com ele e acredito que sim. Porque pouco tempo depois esse jornal parou, fechou, e abriram de novo em uma segunda fase, um ano depois e não foi mais pra frente.

WAZ: E já não era mais o Samuel Wainer (dono do Última Hora).  E ele que contatou o Luís Saindenberg ou não?

Zalla: Ele já tinha esse material*, do Saindenberg. Era O Bandeirante. Então ele propôs. Me parece que o jornal pediu três tiras, então um, a tira do Saindenberg. E ele publicava o material do Delbó, o material meu e ele publicava o material do Luís. Com o tempo, depois que acabou o material do Saidenberg, ele fechou contrato com Manoel Victor Filho, e começou com o Capitão Tarumã. O Capitão Tarumã ele chegou a vender no Rio de Janeiro, no Correio da Manhã, no dia de domingo. Eles agrupavam sete tiras (na verdade quatro) e faziam uma página do Capitão Tarumã.

*O Bandeirante já havia sido publicado no jornal A Nação com o nome de O Caçador de Rebanhos e foi redesenhado para a Barbosa Lessa Produções.

WAZ: Sete tiras num dia só?

Zalla: Eles publicavam sete tiras e faziam uma página, como se fosse uma página dominical. O Correio da Manhã publicava também o Cisco Kid, publicavam sete tiras, dava uma página, e com o Capitão Tarumã fizeram a mesma coisa. Mas eu não sei como é que ficou essa história porque o Maneco (Manuel Victor Filho) não chegou a terminar o personagem, também parou.*

*Capitão Tarumã teve a história completada no Última Hora, mas não no Correio da Manhã, onde foi interrompida.

WAZ: Mas O Bandeirante terminou a história?

Zalla: Sim, o Bandeirante terminou e aí apareceu o Tarumã.

WAZ: Manoel Victor no lugar dessa tira?

Zalla: Exatamente, então as últimas páginas que eu tenho guardadas aqui no meu arquivo estão Maneco com Capitão Tarumã, Delbó com a Gatinha (Paulista) e Jacaré Mendonça, as três tiras.

WAZ: A sequencia sempre era assim: O Bandeirante, A Gatinha e o Jacaré Mendonça?

Zalla: Sim, em São Paulo era assim.

WAZ: Mas a ideia dele eram ser tiras de aventura, a ideia era essa?

Zalla: Sim.

WAZ: Mas você acha que isso era ideia dele ou foi o pessoal do jornal que tinha pedido? Tipo: Ah, me dá três tiras de aventura!

Zalla: Gozado, nunca imaginei que com o tempo teria uma reportagem falando sobre isso! Nunca me perguntaram como foi (criado) o material. Porque a Gatinha foi uma tira que o Delbó levou muito bem, uma tira de atualidade. E claro, o Barbosa não pensou na possibilidade de vender a não ser pros jornais, se pensou, errou em Gatinha Paulista, porque ele colocava só a Gatinha, que era um fenômeno em São Paulo, mais que em outras cidades, então aquilo encaixou. E em Porto Alegre também, claro, eles punham outras tiras também, do Mauricio, em Porto Alegre também.

WAZ: Aí já era a distribuidora do Mauricio?

Zalla: Sim, do Mauricio, claro! Era a distribuidora do Mauricio. Mas o Barbosa agenciava, nessa página de Porto Alegre, essas três tiras nossas.

WAZ: Mas era bem interessante, né? Cada publicação você recebia pela publicação...

Zalla: Era excelente, não era bom! E nessa época, por exemplo, eu comecei ganhando um salário, que nesse momento, nunca tinha sonhado que ia ganhar. Nessa época, não sei se você tem o valor do dinheiro, mas eu, principalmente, me dizia: Hei! Você está privilegiado, porque você, com sete desenhos por dia você vai ganhar isto e isto e não sei o quê!!! Realmente, para mim dava trezentos e poucos mil cruzeiros da época! Era um bom dinheiro!

Então o Barbosa levava participação, é claro, na comissão das tiras e na republicação levava 40%. Disso eu me lembro porque o contrato está aí o tempo todo guardado.

WAZ: Agora, a Gatinha foi criação do José Delbó?

Zalla: A ideia foi do Barbosa, agora o Delbó criou uma Gatinha nessa época, que nos conversamos muito sobre isso, criou uma Gatinha loira! Quando realmente, o padrão de mulher seria morena nessa época. Ainda a Xuxa não estava! E as loiras que vieram depois!

WAZ: Mas a ideia de ser uma aeromoça foi do Delbó?

Zalla: Ah, sim! Barbosa deu a ideia, então, Delbó depois colocou ela como aeromoça, colocou na televisão, em festas com drogas, em Santos. Foi super bem! Colocou contrabando de cocaína, colocou tudo isso!

WAZ: Mas você acha que esse negócio do contrabando, essas coisas, foi o motivo do cara (do jornal) ter cortado?

Zalla: Não, não! Não porque depois tocou vários temas muito bons. Um, por exemplo, a Gatinha conhece um camarada e gostou muito do sujeito, e a mãe, inclusive, também ficou meio preocupada da Gatinha estar interessada no sujeito porque a vida dele não era bem transparente, então, por intermédio da mãe foram averiguar e foram à casa do sujeito. E aí foram atendidas pela mulher que era inválida!

WAZ: Era um bígamo!

Zalla: (Risos) Então, era um mistério interessante! Bem bolado, porque a Gatinha renuncia ao amor do camarada! Porque viu a situação da mulher como era. Então a Gatinha era uma mulher liberal. Mulher liberal mas com uma norma de conduta e tudo isso.

WAZ: E a produção como é que você fazia? Porque você falou que a história você procurava adiantar o máximo possível, né? Mas você conseguia desenvolver bastante por dia? Porque você sempre foi um profissional que teve uma produção constante, né?

Zalla: Eu conseguia, mas aí tinha o problema do Delbó também*! Delbó tinha trabalho, muito trabalho. Então ele fazia o Colorado, nessa época também. Fazia o Vingador para a (editora) Outubro, fazia Tony Mackett para a editora do (Francisco) Romay na Argentina, a (editorial) Yago, então, tinha muito trabalho. Mais a tira da Gatinha.

*Em seus primeiros anos no Brasil, Zalla auxiliava José Delbó, chegando a desenhar integralmente a tira Gatinha Paulista.

Então, normalmente, eu fazia o letreiramento e ele estava mais ou menos sempre em dia e Delbó era um profissional, evidentemente, nunca falhou uma tira, então, praticamente nós publicamos juntos sempre o mesmo número de tiras, número de páginas, assinatura e tudo aquilo lá. Às vezes eu levava dez tiras minhas e três do Delbó. Então, normalmente nessa época eu já estava adiantando, porque eu também queria... é claro, o quadrinho de jornal me ocupava quase todo o tempo, mas estava namorando já o Targo, na editora Outubro, porque eu acompanhava o Delbó quando ia na editora. E conheci o Gedeone, conheci o Nico Rosso, professor na Escola Panamericana, conheci o Wilson Fernandes, conheci muita gente! Porque Delbó nessa época publicava também uma tira no jornal A Nação, que era um tabloide, nessa época, que era do grupo que tinha o Canal 9 (TV Excelsior). Depois tudo isso, é claro, tudo isso também acabou. Então essa tira do Delbó, ele chegou a completar, me parece, e depois inclusive remontou essa tira e foi publicada... o Justiceiro Alado, se chamava no jornal, não me lembro com que título foi publicada na editora Outubro, ele também colocou esse material lá.


Justiceiro Alado por José Delbó.

WAZ: Era uma espécie de super-herói? Um aventureiro?

Zalla: Mais ou menos... Nem era um super-herói, era um cara que tinha um aparelho mecânico, umas asas, voava e tal. Ele tinha diversificado. Ele tinha muito trabalho, então não tinha como adiantar. E o Delbó, inclusive, era um camarada rápido. E ele trabalhava com uma certa rapidez e trabalhava muitas horas. Mas era detalhista, então cuidava do material, não é que publicava por publicar e vamos em frente.

WAZ: Me conta agora do Diário Popular, que você me falou. Das histórias de faroeste! Em que ano foi isso?

Zalla: Em plena revolução. Em 1964 mesmo. No primeiro dia de abril eu já estava trabalhando nessas tiras. O Luís Sanches publicou no Diário Popular, porque a página de tiras do Diário Popular estava a cargo do Luís Sanches. E saia um personagem dele que era o Zé Luis. Você deve lembrar.

WAZ: Que tinha um óculinhos, assim...


Zé Luís por Luís Sanches.
Zalla: Exatamente! Era ele! Era o próprio. Então publicava também o Gedeone, Uk e Uka, me parece. Não! O Gedeone publicava em A Nação! Lamentavelmente essas páginas do Diário Popular eu não tenho. Recortei as tiras, guardei as tiras. Nessa época eu não tinha espaço para ter arquivo como eu tenho agora, então guardei as tiras minhas. Perdão! O Zé Luís ele publicava em A Nação, não publicou no Diário Popular. No Diário Popular parece que ele começou publicando essa tira minha de faroeste, porque o personagem Zé Luís, se ele publicou, publicou depois de A Nação. Porque eu conheci esse personagem no tabloide A Nação. Que publicava do Gedeone, Uk e Uka, publicava Wilson Fernandes, publicava (Fernando) Almeida, tinha um material americano também, publicava o Justiceiro Alado do Delbó. Em A Nação eu não cheguei a publicar.

WAZ: Era uma página inteira?

Zalla: Uma página inteira, formato tabloide.

WAZ: Então daria o quê? Umas dez, doze tiras?

Zalla: Daria umas oito ou nove tiras, porque tinha material americano, duas tiras são americanas.

WAZ: E era diário?

Zalla: Diário.

WAZ: Aí o Luís fez contato com você e pediu especificamente faroeste? Ou você que deu a ideia?

Zalla: Não, o contato foi o seguinte: o Delbó que fez contato e eu acompanhei o Delbó. Luís Sanches tinha um estúdio aqui na Brigadeiro (Luís Antonio), aqui em baixo, quase chegando na (rua) Maria Paula. E nós fomos no estúdio dele. Fomos falar com ele, conhecer o Luís Sanches. Então eu levei uma amostra do que seria o Jacaré Mendonça. Que nem saiu, porque tinham me falado Jacaré Pinto. Quem mudou o nome foi o Barbosa, porque era inconveniente, porque de pronto o Pinto levanta, o Pinto cai, sabe como é e não sei o que! Foi ele que colocou Mendonça! Mas tudo bem, a gente aceitou com muita naturalidade que mudasse o nome, então ficou Jacaré Mendonça. O que eu não sei é como o Barbosa contatou o Luís Sanches. O Luís Sanches passou o material que nós tínhamos deixado com ele, passou para o Barbosa. O Barbosa pegou o endereço com o Luís Sanches e o contato foi dessa maneira. O Luís Sanches fez o contato com o Barbosa Lessa. Porque o Barbosa Lessa, nessa época, já estava trabalhando em jornais, então o Júlio Shimamoto fez um boneco (layout) para o jornal A Folha (de S. Paulo) para o Mauricio, e também foi encarregado por Barbosa Lessa de fazer um boneco para o mesmo suplemento da Folha. A Folha preferiu o boneco cômico, o boneco infantil, do Mauricio, que o do Barbosa não tinha.

WAZ: Era de aventuras?

Zalla: Exatamente! Mas o Shima fez os dois projetos!

WAZ: Mas e a história de faroeste que saiu no Diário Popular? Você já levou pronta ou o Luís que sugeriu?

Zalla: Não me lembro bem mas ele deve ter sugerido. Inclusive essa ideia de fazer uma história em sete tiras foi dele, e isso complica um pouco a coisa. Mas por mim tudo bem, nesse momento eu fazia qualquer coisa!

WAZ: E como é que era o ganho nessa tira, era menor que no Barbosa?

Zalla: Eu já não me lembro, acho que sim.

WAZ: Mas aí você entrega a história completa e acabou?

Zalla: Sim! Entregava sete tiras completas, claro! Entregava a semana. Entreguei as duas primeiras semanas. Depois não fui em frente não me lembro porque. Quer dizer, o trabalho era angustiante. Você tinha que preparar sete tiras e entregar sete tiras juntas. E eu não me lembro se entreguei a primeira e a segunda ou entreguei as duas juntas, catorze tiras. Acho que devo ter entregado as primeiras sete e depois, imediatamente, entreguei as outras sete.

Mas aí, inclusive, já tinha falado de novo com o Barbosa, já tinha um dinheiro para receber, que era muito dinheiro que tinha para receber, e eu não pensava em receber também, aí a coisa deu uma melhorada, só que a tira Jacaré Mendonça cortou. Gatinha continuou pouco tempo e só continuou para o jornal (Última Hora) e continuou os Amores Históricos. E só fiquei com Amores Históricos. Aí então parei  esse negócio de faroeste e fui lá falar com o pessoal da Outubro e aí foi quando me deram Targo.

WAZ: Tinha nome a tira?

Zalla: Isso eu não me lembro. Possivelmente Histórias do Oeste* ou negócio assim.

*Zalla publicou duas aventuras de faroeste no Diário Popular com os nomes de O Covarde e Licki Luke.

WAZ: Mas foi em abril de 1964?

Zalla: Sim, com certeza.

WAZ: Você parou na verdade porque você conseguiu começar a trabalhar com quadrinho mesmo? Com a Taika?

Zalla: Sim! E tinha os Amores Históricos ainda também. Os Amores Históricos já tinha adiantado bastante, o Barbosa tinha me entregado os roteiros. Amores Históricos já estavam adiantados, tinha um tempo sobrando e esse tempo queria entregar uma revista, desenvolver uma revista. Então foi aí quando comecei com Targo.

WAZ: Mas na Barbosa Lessa no fim você recebeu tudo?

Zalla: Sim! Ele foi muito honesto.

WAZ: Você perdeu o contato depois que ele foi pra Porto Alegre, seria isso?

Zalla: Sim.

WAZ: Mas isso foi em 1964 mesmo?

Zalla: Eu acho que sim, 1964, porque depois o Barbosa eu encontrei numa reunião na Associação Paulista de Pintores e se falou muito sobre quadrinhos, na lei de nacionalização de quadrinhos e tudo aquilo lá e nesse dia Barbosa Lessa estava lá. Depois de um tempo, isso acho que foi em 1966, 1968, por aí. Batendo papo com Barbosa, levei ele para explicar a experiência que tinha tido como distribuidor de tiras. Foi a última vez que vi Barbosa, depois ele praticamente continuou a carreira dele no Sul até o falecimento dele.

WAZ: Faz muito tempo?

Zalla: O falecimento? Sim, bastante tempo! Tem mais de dez anos.

WAZ: Naquela época em que ele estava trabalhando com vocês quantos anos ele tinha?

Zalla: (Risos) É uma outra coisa que eu não perguntei também! Mas ele devia ser um homem de quarenta e poucos anos, 48, 50, não chegaria a 50 anos, um cara dinâmico, ativo! Em plena juventude, em plena juventude quer dizer, em plena vida! Só que o falecimento dele foi muito depois, bastante depois. Ele já tinha os livros, fez alguns trabalhos, inclusive trabalhos, me parece, se não me engano, que Flávio Colin ilustrou. Não sei se a História do Rio Grande do Sul que Flávio Colin desenvolveu. Então ele estava mais ou menos ligado, mas sempre na parte folclórica, de grupos folclóricos. Ele conhecia muito a parte gaúcha, essa parte histórica.

WAZ: E conta do Notícias Populares, que você publicou as tiras de terror! Eu acho, se não me engano, não tenho certeza, mas acho que é o único desenhista nacional que publicou terror em jornal, né?

Zalla: Acho que sim.

WAZ: Acho que ninguém mais publicou terror em tiras! É uma coisa bem diferente!

Zalla: O negócio começou com Rivaldo, Rivaldo Chinem. Um dia nos encontramos em um bar na esquina da (rua) Sampson com a Joli, que a gente tinha chegado pra trabalhar na editora IBEP nessa época, e começamos a falar e ele perguntou se não queria que fizessem uma reportagem. E eu falei que sim, inclusive ele falou, por que não tentamos fazer uma prova, o que você acha de se publicar uma tira? Eu falo com meu pessoal e terei oportunidade. E eu achei interessante. A tira em princípio ia se chamar Calafrio. A ideia era, eu entregava a tira e ele me correspondia com um artigo no jornal. A artigo foi publicada no início, antes de começar a tira, mas o jornal não se interessou pelo artigo.O jornal permitia, embaixo da tira fazer uma publicidade, em cada tira: Hoje, Calafrio nas bancas! Por exemplo: Hoje, Mestres do Terror nas bancas! Na própria tira, publicado em baixo.

WAZ: Mas esse artigo seria o que? Um artigo de terror, uma crônica?

Zalla: Claro, sim!

WAZ: Mas você que escreveria?

Zalla: Não, eles iam fazer uma reportagem.

WAZ: Mas eles iam fazer a reportagem e a tira sairia junto?

Zalla: Não, a tira aparecia na página de tiras. Mas eu achava que a forma era fazer uma reportagem sobre a forma de fazer uma tira de terror, sobre uma série de coisas, compreende? Como você trabalhava a tira e de que tipo de elementos, enfim, um negócio assim acompanhando a linha do desenho e teria a tira no jornal. Mas eles preferiram a publicidade em baixo da tira. Então, eu fiz uma aventura, fiz a primeira aventura, mas não deu resultado, porque uma das coisas que o jornal estava interessado em saber também é se as vendas da revista tinham aumentado com essa aparição da tira na página do jornal Notícias Populares. E não mesmo, então ele expôs pra mim: acho que não tem nada a ver.

WAZ: Mas saiu uma história só? Não saiu mais?

Zalla: Uma história só! Não saiu mais pelo seguinte: teve um atraso de um dia e que o diretor do jornal achou ruim e cancelou a tira!

WAZ: Mas republicou, ou ficou sem tira?

Zalla: Não, teve um dia que não apareceu.

WAZ: Então a história não se completou?

Zalla: A história se completou, mas a segunda história que eu estava completando não deu para eu entregar, em data, para sair imediatamente após o final da outra, ou seja, era um dia sem tira e depois no outro dia aprecia essa segunda história. Porque na tira anterior eu tinha feito uma publicidade da aventura como era, só que não apareceu no dia seguinte, apareceria um dia depois, e o cara achou ruim, não sei o quê, e cancelou a tira.

WAZ: E era uma história inédita?

Zalla: Não, eram republicadas, é claro, porque eu não recebia nada por esse material. Se tivesse que fazer inéditas aí já seriam outros quinhentos, porque, evidentemente, eu teria que dedicar muito mais tempo e o tempo esse era de remontar a tira e fazer letreiramento novo, porque em jornal se eu usasse o mesmo letreiramento ia ficar muito pequeno. Em jornal você tem que em, certas falas, sintetizá-las, o letreiramento deve ser feito de novo e claro, o tamanho da tira também é diferente.

WAZ: Você adaptou pro jornal?

Zalla: Sim, adaptei pro jornal, exatamente! Porque no outro dia ia entregar toda a aventura, completa! Não pensei que por um dia que não saísse ia reclamar dessa maneira. Então no outro dia levei a história completa, seria mais ou menos umas 30 tiras, ou 25 tiras a segunda história! E aí veio esse negócio...

WAZ: Mas a primeira quantas dias eram mais ou menos?

Zalla: A primeira durou quase que um mês, 30 e poucas tiras.

WAZ: E era uma história fechada?

Zalla: Sim, sim, e a história fechou! 35 tiras e a história fechou.

WAZ: Dava uma história longa!

Zalla: Dava, porque nesse quadrinho alguma coisa eu criava em cima, por exemplo, uma sequencia já não era um quadrinho, vamos dizer, de 12 páginas de uma revista comum de terror, nesse material eu acrescentava algum quadrinho, às vezes tirava, dava um sentido de movimento de jornal, era um pouco diferente também. Procurava fazer um trabalho mais ou menos bem feito.

WAZ: Dar continuidade...

Zalla: dar continuidade. Então foi aí que me atrasei esse dia, para levar toda a história completa. Se tivesse levado duas ou três tiras, não teria acontecido nada, teria continuado. Mas tinha duas coisas, e quero ser honesto nesse sentido: primeiro, foi o primeiro trabalho que publiquei sem receber, então, era profissional, só profissional e hoje a situação mudou muito. Tem um trabalho que eu faço aí na faixa, para um amigo, não tem problema nenhum, não tem condições hoje em dia de que esse trabalho custe tanto, ou valer tanto. Mas eu tinha também a certeza de que a tira não funcionava para a venda da revista, então é um negócio que se eu houvesse continuado, um mês, dois, três, eu teria proposto parar com a tira. Porque para mim era um trabalho extra, ou teria que dar o trabalho para outro desenhista remontar a tira. Mas você encontrar um desenhista que te remonte a tira, te faça o letreiramento e te faça o decorado não é fácil, você sabe disso!

WAZ: Mas eu não entendi. A primeira história você entregou completa? Ou entregou picada?

Zalla: Ia entregando picado. Ia produzindo e entregando. O que eu já queria a partir da segunda história é entregar completa. Assim pelo menos durante vinte dias me esquecia dessa história e já ia preparando a terceira. Esse adiantamento, quando eu falo em tiras, é muito importante porque a tira é uma via de desenho.

WAZ: Eu colecionei na época viu? Essa tira eu recortava do jornal!

Zalla: Então você já tem material...

WAZ: Essa pelo menos eu tenho. E você se deu conta que essa foi na época a única tira de terror?

Zalla: Não, não tinha pensado nisso porque para mim tira é tira! Eu nunca considerei uma tira de terror para ser publicada, por exemplo, no Diário Popular. Pode ser publicada em qualquer jornal. Nunca tive preconceito com o terror, pelo contrário, adoro o terror. Por isso precisamente nunca pensei.

WAZ: É, mas é uma coisa engraçada, porque o pessoal nunca imaginou publicar! Mesmo no período dos anos 1960.

Zalla: Veja, não estou certo disso. Você que é pesquisador deve conhecer melhor do que eu, mas uma oportunidade, conheci um camarada que me falou que o jornal A Nação já publicava quadrinhos, antes dessa passagem do Luís Sanches, e o cara me trouxe uma série de páginas, porque ele era desenhista também, só que não foi para frente, e ele publicava uma tira junto com um material americano que saia no jornal, e não sei se tinha outra tira nacional também, e ele me deu aquelas páginas e eu agradeci, porque achei bacana, porque era quadrinho brasileiro que eu não conhecia. E isso foi publicado em 1962 me parece. Só que um tempo depois ele me telefonou e pediu se eu podia devolver essas páginas de jornal. Então claro, eu devolvi essas páginas, agradeci o carinho que o cara teve no momento, para dar essas páginas, achei muito bacana. E nem tive tempo de tirar um xerox, nessa época, inclusive, o xerox era muito ruim, não é como hoje que você tem o xerox e vale por um original.

WAZ: O com o tempo o xerox fica tudo cinza.

Zalla: E às vezes o próprio xerox não era uma máquina nova que o cara tava trabalhando, era difícil você ter um xerox como você tem hoje. Hoje é dez! Hoje tem muitas histórias recentes que o cara deixa o xerox e vale por um original. Não é original mas vale por um original.

WAZ: Tá bom, muito bom!