sábado, 2 de junho de 2018

Zezo - Entrevista - 1984

Entrevista publicada no fanzine Quadrix nº 4, novembro de 1984.

A Técnica do Desenho - Editora Bentivegna

Nesse número entrevistamos José Rivelli Neto ou Zezo, um dos mais expressivos desenhistas do terror nacional das décadas de 1950 e início de 1960.

Além de histórias avulsas de cowboy, românticas, infantis e de terror, criou para a Ed. La Selva uma das melhores adaptações do clássico Frankenstein, criou também centenas de capas e HQs para a Ed. Outubro e para a própria Ed. La Selva.

No Jornal Juvenil, entre 1961 e 1962, além de ilustrações e capas, criou duas HQs: O Tubarão Voador (de aventuras no mar) e Rumo ao Infinito (aventura espacial).

Desenhou ainda para a distribuidora de tiras de Maurício de Sousa, em 1966, a história de espionagem chamada Dorinha da qual só fez 6 tiras, sendo completada por outro desenhista.

Em 1963 entrou na área de propaganda da Duratex, e hoje é o diretor desse setor. Na Duratex ilustrou a revista O Serrote, de informações técnicas, além de desenvolver o personagem Chico Minhoca (criado por Maurício para a mesma revista) e criou Mutuca e Bola Tudo (todos com roteiros do Dr. Zak).

Sua mais recente criação foi O Rino Boy, tira cômica que saiu em algumas edições da revista AED.

Trazemos então a entrevista com esse grande mestre José Rivelli Neto ou Zezo (que por sinal, é o unico na Duratex que é citado duas vezes na lista de ramais telefônicos, uma como José Rivelli Neto e outra como Zezo), que foi gravada em 17/04/84 e teve a participação do Franco de Rosa e do Worney Almeida de Souza (WAZ).

QUADRIX: Como começou seu contato com os quadrinhos e o desenho?

ZEZO: Como todo o desenhista, lendo as revistas de HQ que foi despertando uma vontade de fazer igual, e naquele tempo morava em Santos, não tinha ninguém que pudesse ensinar como era feito um quadrinho, e você tinha que aprender por si só, e sempre o caderno e os livros da escola cheios de desenhinhos, isso foi continuando, sempre desenhando para mim.

Começei a trabalhar em coisas totalmente diferentes, em uma firma de representação que trabalhava com madeiras, eu estava deslocado, os dias não passavam, e desenhando sem maiores consequências, até que finalmente por uma coincidência, um tio tinha casado pela segunda vez e um sobrinho dessa senhora tinha uma agência em São Paulo, e até que um dia me enchendo de coragen, e através dela, apresentei uns desenhinhos para este sobrinho, João Natale Neto, e a agência chamava-se Equipe Propaganda.

QUADRIX: Qual era a sua idade?

ZEZO: Tinha uns 22 ou 23 anos, já tinha uma vida praticamente formada, quando decidi dar uma quinada, saí de Santos e vim para São Paulo, então comecei a trabalhar nessa agência em 1953, em 1954 fiquei em Santos cuidando de meu pai, que acabou falecendo em outubro, nesse meio tempo o estúdio se desmembrou da empresa, e se fundou o Inter- Estúdio, nele comecei realmente a trabalhar, entrando na propaganda, e conhecendo na prática, trabalhando como free-lancer, e sempre com um gosto latente pelos quadrinhos.

No próprio estúdio eu fiz uma HQ e apresentei na La Selva em 1955 e foi aceita, e nessa entrada na La Selva começei fazer as HQs e também as capas.

Revista Frankenstein nº 10 - editora La Selva - 1961

QUADRIX: Como foi o contato com a La Selva?

ZEZO: Eu levei a primeira vez, A Técnica do Desenho - Editora Bentivegna conversamos e compraramn a história, e por causa daquela lei contra as HQs nos EUA, especialmente contra o terror, é que deu chance a uma geração de brasileiros, se não fosse a proibição a editora não ia comprar, por que eles vinham publicando e republicando dezenas de vezes, mas o material começou a escassear e pegavam o que aparecesse, bons, médios e maus.

QUADRIX: A La Selva já tinha uma equipe de colaboradores?

ZEZO: Já tinha Jayme Cortez, Miguel Penteado, Aylthon Thomaz, Igayara, Queiroz, Gedeone e uma série de pessoas e alguns só faziam quadrinhos, como o Maurício de Souza. Depois houve a oportunidade da revista Frankenstein.

QUADRIX: Existia algum filme na época, alguma coisa para se basear nessa criação?

ZEZO: Nada, nada, tinha um pré-roteiro, na verdade uma sinopse bem resumida, porque eu gostava de ter liberdade para desenvolver a história.

QUADRIX: Antes do Frankenstein já havia se dedicado a algum personagem?

ZEZO: Não, só HQs avulsas de comboy, românticas, infantis, mas especialmente de terror, uma média de 70%.

QUADRIX: Quanto tempo durou o Frankenstein?

ZEZO: Um ano, 12 números.

QUADRIX: Por que parou?

ZEZO: Problema interno da editora e resolveram terminar com a revista.

QUADRIX: A HQ do Frankenstein tinha uma ambientação numa época precisa, Alemanha no final do século 19...

ZEZO: especialmente Bavária.

QUADRIX: Chegou a pesquisar casas, uniformes?

ZEZO: Eu sempre me preocupei com uniformes e a arquitetura, eram mais ou menos baseados na época.

QUADRIX: Diferente de outras adaptações do Frankenstein, brasileiras ou americanas, o seu Frankenstein era onipresente, geralmente encerrava história, era o fator determinante, como conseguiu
esse desenvolvimento?

ZEZO: Na verdade foi instintivo, eu sentia desta maneira e passava para o papel, o tipo de ambientação me agradava, o tema era bom, e ele não era um monstro mau, era um produto, foi pena ter terminado.

QUADRIX: Como era o processo de criação das capas, fazia com modelos?

ZEZO: Não, nunca fiz com modelos, meu traço era solto, imaginava, enquadrava, traçava o lay-out e baseado na história criava uma capa.

QUADRIX: Sempre tinha a história como referencial?

ZEZO: 99%, cheguei a fazer capas que não tinham nada a ver com a história, só com alguns elementos de uma capa de terror.

Rumo ao Infinito - Folhinha de S. Paulo - 1965

QUADRIX: Você também trabalhou para a Ed. Outubro, o que ela representou para a HQ nacional?

ZEZO: Quando a La Selva diminuio o ritmo, trabalhei também para a Outubro, que era mais uma editora e mais alguns títulos, e mais um campo muito bom para trabalhar.

QUADRIX: Então realmente existia um campo de trabalho?

ZEZO: Não dava para ficar rico, mas dava para sobreviver.

QUADRIX: Qual era o nº de profissionais?

ZEZO: Mais ou menos uns 30.

QUADRIX: Tinha alguma disputa de preços de páginas entre as editoras?

ZEZO: Não, porque evidente que os editores deveriam combinar o preço.

QUADRIX: O preço era razoável?

ZEZO: Já tinha sido muito bom, por exemplo, com uma capa de revista se comprava uma motocicleta em 1950, mas no meu tempo com uma capa você já não fazia esse tipo de coisa, mas com 10 capas e 3 ou 4 HQs você canseguia viver, era 500 ou 800 cruzeiros por página, e 150 para uma capa, dava em média 15 mil cruzeiros por mês, 20 mil se fosse uma máquina.

QUADRIX: Qual era a produção mensal por página dos desenhistas?

ZEZO: De 20 a 30 páginas.

O Tubarão Voador - Jornal Juvenil - 1962

QUADRIX: Na Ed. Outubro os desenhistas se encontravam, trocavam idéias?

ZEZO: Como eu disse era mais um campo de trabalho, aumentava o faturamento, e na realidade não se encontravam, mas na data de entrega dos trabalhos, era o melhor dia para mim, porque era o dia que você terminava aquela luta contra o papel branco, juntava as capas e HQs e dava uma certa satisfação ver a produção acabada.

propaganda é muito dia a dia, quadrinhos têm vida, aí você conclui a produção do mês, leva aquele misto de orgulho para o editor, e encontra outro desenhista que fez o mesmo e ali se conversava, trocava-se ideias.

QUADRIX: Você chegou a trabalhar como arte-finalista?

ZEZO: Não, fazia tudo, só entregava sem as letras, eu já deixava o balão marcado, já sabia o que o personagem estava dizendo, dificilmente não dava espaço, e o desenho não sofria retoques.

QUADRIX: Sempre achei você o desenhista mais dinâmico da fase do terror, trabalhava com preto e branco, não repetia ângulos, como conseguiu esse desenvolvimento?

ZEZO: Estudando, olhando, sentindo, com Alex Raymond, Milton Caniff, e procurava extrair o máximo deles.

QUADRIX: Fazia estudos sobre o trabalho de Alex Raymond?

ZEZO: Não, eu jamais peguei um quadrinho de Raymond pus na frente e fiz igual, eu olhava, olhava e depois fazia outra coisa com imaginação.

QUADRIX: Quantas capas chegou a desenhar?

ZEZO: Dez por mês, umas 100 por ano, creio que fiz umas 300 capas naquele período.

QUADRIX: A última editora (que trabalhou) foi a Outubro, chegou a recuperar alguma história, algum original?

ZEZO: Alguma coisa, fiquei com muita prova de fotolito de capas, e no outro jornal em que trabalhei, o Jornal Juvenil, entre 1960 e 1962, fiquei com muitos originais.

QUADRIX: Tinha algum personagem?

ZEZO: Tinha um personagem chamado Tubarão Voador, era uma história de aventuras, minha criação.

QUADRIX: Chegou a fazer HQ colorida?

ZEZO: Só aqui da Duratex.

QUADRIX: Queria que falasse de sua segunda fase profissional na Duratex.

Tiras do personagem Rino Boy.

ZEZO: Entrei em 1963 na Duratex na área de propaganda, fazendo folhetos, cadernos de instrução técnica. Durante alguns anos fizemos uma revista chamada O Serrote, totalmente ilustrada, dando dicas sobre marcenaria e carpintaria, na verdade foi uma precursora das que existem hoje, de hooby e lazer. Ensinava como pregar, o nome das peças, ferramentas, tudo isso ilustrado, e tinha alguns personagens, um deles era Chico Minhoca, um caipirinha, tipo Chico Bento, feito pelo Maurício de Souza, que depois eu desenvolvi. 

Chico contava coisas sobre o produto, sempre de forma cômica. Um outro personagem era o Bola Tudo, um camarada que sempre ajudava o patrão numa dificuldade, e inventava alguma coisa usando nosso produto, outro personagem era o Mutuca, que era companheiro do Chico Minhoca. Os três acabaram tendo uma edição especial, colorida, chamada “2 Batutas no Serrote”, que também mostrava o uso do produto.

A revista terminou numa determinada época, e mais tarde a Associação dos Empregados da Duratex, criou a revista da AED, e de vez em quando, conforme o tempo permitia, fazia algumas tirinhas. Usava um personagem inventado de brincadeira chamado Rino Boy, usando o nome Rino da marca do rinoceronte (que é o simbolo da Duratex), e o Boy satirizando os super-herois, sairam em alguns números, depois a falta de tempo impediu uma continuidade.

Hoje estou na parte administrativa, mas continuo acompanhando o quadrinho.

2 Batutas no Serrote - Revista O Serrote, Duratex.

2 comentários:

Sebastião Seabra disse...

Maravilha Luigi...

Luigi Rocco disse...

Obrigado pela visita, Seabra. abs