Motogirl faz parte de uma série de aventuras com temas motociclísticos lançadas pela revista Motocross, da editora Pinus, em 1983, com patrocínio de uma concessionária Yamaha.
As histórias, criadas pela dupla Franco de Rosa e Jal, tinham aquela pegada provocativa e até erótica típica dos quadrinhos desse período, testando os limites da censura oficial, ou da suposta inexistência dela.
Motogirl era um boneco que não era um boneco, mas um ser humano, e que pilotava uma moto guiada por um manequim de loja que era, na verdade, um manequim de loja!
Sobre as histórias, Franco deu o seguinte depoimento:
"Quando
mudei de volta de Curitiba, em 1983. Eu estava sem trabalho. A Grafipar estava
fechando. Ainda cheguei a realizar algumas coisas pra lá. Mais umas duas
histórias no máximo. Isso porque o Seto se esforçou.
Aqui
em São Paulo, procurei amigos, editoras. Fiz uma tour por redações, da Abril,
DCI, Folha da Trade, Notícias Populares, Shopping News. Agências de propaganda.
Fui seguindo dicas de amigos. Cheguei a fazer um trabalho bem bacana para a
Sears ou Mesbla, via Editora Globo. Porque fui levar meu portfólio numa
sexta-feira, ao Julio Andrade. Eles tinha um especialista naquele tipo de
lay-out e manchas. Que me encomendaram de pronto, porque eu estava disponível, e
o especialista deles ia viajar. Então eu comprei tintas ecoline, pinceis e papel
importado, com dinheiro emprestado por minha mãe. Trabalhei o fim de semana
todo, e recebi 15 dias depois. Foi providencial. Agradeço até hoje ao
Julinho.
Eu
havia iniciado um projeto com o Júlio, de FC. Uma história bastante original que
ele criou, e eu seguia o estilo de Philipe Druillet. Ainda tenho alguns dos
estudos dessa obra. Que, não foi continuada, porque era um projeto pra Abril. E
eles descontinuaram tal projeto. Que reunia vários artistas brasileiros. Isso em
1979/80...
Bem.
Então eu saia todos os dias em busca de frilas e emprego. O Jal, amigo desde o
tempo do Avaré 2, em 1975, que já havia me indicado para trabalhar na Tupi,
quando ele fazia os Trapalhões, e eu fui fazer os cartuns do programa Mural, da
Ana Maria Braga. Também, ele fazia parte da nossa turma do Clube do Gibi. E
parceiro da revista Klik, da Ebal, que eu havia coordenado, entre 79 e 80.
Trabalhava como chargista do DCI.
Naquele
período as motocicletas estavam em expansão no Brasil. Havia a revista Clube
Honda. A Duas Rodas, que era periódica, e circulava em bancas já fazia um tempo.
E surgiu então a Motocross, focando em trilhas e esse segmento. O Jal tinha um
colega jornalista que trabalhava na Motocross. Então bolou pra ela uma série de
HQs que eram publicadas com o patrocínio da Centauro Motocross. Que, acredito,
ainda exista. Uma loja especializada.
Foram
realizadas quatro histórias, se não me engano. Motogirl é uma delas. Há uma que
é um rali. Outra que tem como protagonista um índio brasileiro. E outra com um
centauro. Que, não foi concluída. Todas de apenas 2 páginas cada. Todas escritas
pelo Jal. Em roteiros rascunhados, como é próprio de cartunistas.E ele é dos
bons. Com traços em síntese gráfica, imediatamente reconhecível.
Motogirl
é a mais divertida. Pois o seu final é realmente surpreendente. É genial. Gerou um personagem, que poderia ser continuado. Mas as circunstâncias, ou nosso
desprendimento, focando muitas outras coisas, não fez isso acontecer.
Também
cheguei a publicar na revistas Duas Rodas, duas tiras da série Motoca Kid.
Criada e escrita por um amigo do tempo de colégio, o Mateus Bio. Éramos da mesma
classe, e nos aproximamos ao realizar o jornal do escola. Para em seguida criar
um fanzine só nosso, o Frama, em 1971. Foram realizadas 15 tiras de Motoca Kid,
o Mateus tinha uma moto de 50 CC. Depois virou um grande profissional do setor
motociclístico. Também recomendados pelo Jal, fomos parar na TV Cultura, em um
programa de TV que mostrava trabalhos de artistas adolescentes. Até hoje guardo
as caricaturas que o artista do programa fez. Minha e do Mateus. Depois o Motoca
Kid foi publicado no jornal Notícias Populares em uma nova série, Picaretagens.
Onde apareceram diferentes séries e personagens, como Fuscão Preto, os Bobalhões
(paródia de Os Trapalhões) e outras experiências em humor gráfico. Até
surrealistas.
Motoca Kid na tira Caras e caretas, Folha da Tarde (SP), 1987.
Também
cheguei a escrever desenhar uma HQ de duas páginas, do Super-Honda, para a
revista Clube Honda, em dupla com ilustrador e quadrinhista Jô Fevereiro. O
pilar do grupo Octopus, que era composto pelos roteiristas Cassiano Roda e
Ronaldo Antonelli, com Seabra, Jô, Vilachã e eu nos desenhos. Substituímos então
meu parceiro de longa data, o Seabra, que ficou doente subitamente e
impossibilitado de realizar a sua série periódica, para aquele publicação que
era dirigida pelo Dinho, o baterista do grupo Os Mutantes.
Naquele
período eu substituí também, por 25 dias, o Jal em uma de suas férias no DCI.
Era comum isso, então. O Bira Dantas, substituiu o Novaes uma vez na Folha da
Tarde. Isso nos dava cancha editorial. Também, voltei a trabalhar como
funcionário do setor de publicidade do jornal semanal Shopping News, do grupo
DCI, onde eu era empregado antes, de 1978 a 1980.
Ainda
dentro do tema motociclismo. Introduzi o personagem Motoqueiro na minha série de
tiras diárias Caras e Caretas, criada para o jornal Folha da Tarde. O personagem
tem o nome de Mateus, por razão óbvia. E nunca tira o capacete. Assessório
obrigatório então, mas que o Mateus não usava em nosso tempo de Motoca Kid,
Praça Atrapalhado e Chucrutz. Séries que meu amigo chegou a colaborar com
roteiros.
Tenho
uma sinopse de uma HQ de ficção científica onde se usa motocicletas dentro de
tubos. Mas nunca foi desenhada. Foi inspirada nos filmes Roller Ball, Tron e no
visual de Forever People do Kirby. Mas até hoje está em sinopse. Talvez um dia
vire parte uma série de contos ilustrados.
Eu nunca tive moto. Mas levei três tombos homéricos, como carona
do Mateus. O primeiro na saída de nossa apresentação na TV Cultura, na Marginal
Tietê, debaixo de chuva. Depois, descendo a Rua da Consolação, no meio do
trânsito, porque bati o joelho na traseira de um Opala. E cai rolando entre os
carros. E, graças a Deus, não fui atropelado. E, por último. Fui arremessado 2
metros no ar, ao sairmos da Biblioteca Mário de Andrade. Foram raladas
suficientes pra não me atrever a querer pilotar esse veículo veloz, econômico e
prático, mas que também é responsável por mais de 70% das lesões ortopédicas do
pais.
Um detalhe justamente sobre quando fui receber o pagamento de Motogirl. Fui até a
editora pois eles preferiam pagar em dinheiro. Então levei meu filho Daniel, que devia estar com uns 3 aninhos. Na volta comprei um carrinho pra ele. E ele adormeceu no metrô. Então eu fui guardar o carrinho em minha mochila. No momento em que fui
fazer isso. Um senhora gorda caiu sobre mim, saindo apressada e descendo na
estação seguinte, pedindo desculpas. Ela pungou minha carteira com o meu pagamento e o do Jal.
Tive que pagar o Jal só uns 15 dias depois... Eu desci do metrô, na estação,
seguinte. Pois notei na hora. Avisei o segurança. Acionaram outra estações. Minha carteira, com documentos e tal, estava jogada no chão da
estação. A mulher já era conhecida dos seguranças. Já havia sido presa antes. Foi a única vez que isso aconteceu comigo, apesar de sempre receber muitas vezes em dinheiro. Pois era hábito de
muitos pagadores".
Jal disse o seguinte: "Pois é, nem lembrava desse... Lembro de um personagem índio que tinha uma moto. Acho que esse da Motogirl nem participei. Como eu tinha conseguido o espaço acho que o Franco me colocou nos créditos. A HQ com o motoqueiro índio eu participei com o texto. Sei que fiz junto com o Franco uma ou duas historinhas, mas não era esse personagem. Depois o Franco continuou e criou esse personagem para a revista de moto. Acho que é isso. Ele deve lembrar melhor que eu".
OS AUTORES
Sobre o Jal, a Wikipedia tem as seguintes informações: "José Alberto Lovetro, mais conhecido como Jal, é cartunista, roteirista, jornalista e presidente da Associação dos Cartunistas do Brasil (ACB).
Iniciou sua carreira na Folha de S.Paulo em 1973, trabalhando depois para os principais veículos de comunicação do país como o jornal O Estado de São Paulo, TV Cultura, TV Tupi, The Brazilians (EUA), Pasquim, Revista Sem Fronteiras (Holanda/Bélgica), DCI, TV Bandeirantes, TV Gazeta (SP), TV Manchete, Revista Semanário, Rádio Tupi, TV SENAC/SESC entre outros.
Ao lado de Gualberto Costa, Franco de Rosa e Worney Almeida de Souza, ajudou a fundar a Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo (AQC - ESP), responsável pelo Prêmio Angelo Agostini, posteriormente a dupla sairia da AQC e fundaria o Troféu HQ Mix uma das principais premiações brasileiras na área de quadrinhos. Em 1989, ganhou o Troféu Jayme Cortez, concedido no Prêmio Angelo Agostini a quem se destaca na atuação em prol do quadrinho brasileiro. No mesmo ano, também ganhou o Troféu HQ Mix de 'melhor editor'".
Sobre o Franco, a Enciclopédia das Quadrinhos (Goida / André Kleinerte - L&PM - 2011) nos trás: "ROSA, Franco de Brasil - (1956) - Roteirista, desenhista, pesquisador e editor, Franco de Rosa é um dos nomes mais ativos dos quadrinhos brasileiros. Começou com as tiras diárias de "Capitão Caatinga" - ilustrações de Seabra - no Notícias Populares de São Paulo. A série passou das mil tiras.
No final da década de 70, afastou-se de seu emprego de publicitário para dedicar-se por inteiro aos quadrinhos da Grafipar. Além de roteirizar e ilustrar algumas histórias, Franco participou de um grupo de criação que se chamava Octopus, formado também por Vilachã, Seabra e josmar. Também colaborou na Ebal na revista de humor Klik e na edição nacional de Zorro (não o Lone Ranger, mas o clássico, de capa e espada). Também colaborou nas revistas Inter Quadrinhos, Mephisto e Futebol e Raça.
Editou vários álbuns e organizou volumes como A arte de Jayme Cortez (Press Ed., 1986), O comendador dos quadrinhos em o espírito da guerra - Eugenio Colonnese (Opera Graphica, 2001) e Fantasma aos domingos (Opera Graphica, 2006). Seu trabalho mais recente como roteirista foi para o álbum ilustrado por Rodolfo Zalla, Chico Xavier em quadrinhos (Ediouro, 2009). Pela Opera Graphica, em 2003, apresentou o álbum As taradinhas dos quadrinhos, uma bela pesquisa sobre erotismo nas HQs".
Franco na revista Klik, editora Ebal.
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